Na prática, o veto parcial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à lei que impõe restrições à saída temporária de presos, conhecida popularmente como “saidinha”, não vai garantir os direitos previstos na Lei de Execução Penal aos presos do regime semiaberto, conforme recomendação do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski.
Segundo a jurista e mestre em Direito Penal Jacqueline Valles, as novas regras devem inviabilizar a concessão do benefício para a maior parte da população carcerária, representando um retrocesso significativo no sistema de reintegração social dos presos no Brasil. “Historicamente, a Lei nº 7.210, promulgada em 1984 durante o regime ditatorial já carregava uma preocupação com a reintegração do preso à sociedade após o cumprimento de sua pena. E isso em um dos momentos mais conservadores da nossa história. Institutos como a progressão de regime, o livramento condicional e, especialmente, as saídas temporárias, foram criados com o intuito de facilitar essa transição e garantir a ressocialização, de modo a evitar a reincidência no crime”, observa a jurista.
Jacqueline ressalta que 95% dos detentos beneficiados pelas saídas temporárias retornam sem problemas às prisões, demonstrando a eficácia desse mecanismo na preparação para o retorno ao convívio social. “Esse retorno tem que ser paulatino, para garantir a ressocialização e, portanto, evitar que os egressos voltem a praticar crimes”, afirma.
Novas regras
A nova legislação sancionada por Lula, ao proibir a saída temporária para condenados por crimes hediondos e de grave ameaça, restringe severamente o acesso a esse benefício. Segundo Valles, essa medida exclui uma grande parcela dos reeducandos, particularmente aqueles condenados por tráfico, um crime não violento, mas enquadrado como hediondo, afetando diretamente a maior parte da população carcerária.
Segundo a advogada, a imposição do exame criminológico como requisito para a progressão de regime, criará um gargalo no Judiciário e poderá aumentar a pressão no sistema prisional, conforme já alardeado por entidades de servidores que atuam no sistema. “A falta de infraestrutura e de profissionais qualificados nos presídios para a realização desses exames criará um gargalo, impedindo que muitos detentos elegíveis ao benefício pudessem efetivamente usufruir dele devido à escassez de recursos humanos para avaliação”, observa.
A análise da jurista, no entanto, é de que, embora o veto busque mitigar os efeitos mais drásticos da lei, a restrição imposta ainda representa um obstáculo significativo à reintegração de um grande número de detentos, exacerbando problemas já existentes no sistema prisional brasileiro.