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Carlos Malta lança o álbum “Pimentinha Sessions” em homenagem à Elis Regina

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No dia 7 de junho, Carlos Malta lançará o álbum “Pimentinha Sessions”, uma obra que promete mostrar a essência da música instrumental brasileira aliada ao universo da música de Elis Regina. Com a coprodução fonográfica de Carlos Malta Produções Artísticas e Mills Records, o álbum traz uma abordagem única ao apresentar clássicos imortalizados na voz da “Pimentinha”. O trabalho traz as faixas que fizeram parte do último disco da cantora: “Vivendo e Aprendendo a Jogar” (Guilherme Arantes), “O Trem Azul” (Lô Borges e Ronaldo Bastos), “Alô, Alô, Marciano” (Rita Lee e Roberto de Carvalho) e “Se eu quiser falar com Deus” (Gilberto Gil) – uma jornada de música instrumental repleta de referências e inovação.

O projeto em homenagem à Elis Regina começou com o relançamento de “Pimenta”, em janeiro deste ano (o álbum foi originalmente lançado em 2000) – https://mills-records.lnk.to/Pimenta. Dando continuidade, para “Pimentinha Sessions” Carlos Malta reuniu um time de jovens músicos para dar vida ao novo formato das músicas escolhidas: Antonio Fischer-Band (piano), Giordano Gasperin (contrabaixo), Haroldo Eiras (guitarra) Matu Miranda (vocalizes), Antonio Sechin (saxofone) e Fofo Black (bateria).

Para celebrar estes dois álbuns, Carlos Malta fará apresentação especial de lançamento com o show ‘Pimenta Pimentinha’ no Espaço Ecovilla Rihappy – Teatro Tom Jobim no dia 9 de julho.

 

Release ‘Pimentinha Sessions’ por Hugo Suckman

Artista inquieta, para dizer o mínimo, Elis Regina sempre buscou renovar-se. Lá por 1980, pressentindo mudanças de rumo numa música – a popular brasileira – na qual suas escolhas e caminhos determinavam as coisas havia pelo menos uns 15 anos, ela resolveu gravar compositores tanto mais novos que ela como de outras origens estéticas. Gravou, por exemplo, o “roqueiro” Roberto de Carvalho, “Alô, alô marciano”; o pop Guilherme Arantes de “Aprendendo a jogar”; e o progressivo mineiro Lô Borges, “O trem azul”.

Em comum aos três, além da pouca idade, uma extraordinária inventividade melódica e harmônica, e informações musicais diferentes e posteriores da formação de Elis, aquela origem incrível calcada no samba, bolero, bossa, a canção popular e jazz. Os três partiam disso tudo, para além. Elis aparentemente queria seguir nesses novos rumos (como, aliás, fizera tantas vezes antes).

Não por acaso, o flautista e saxofonista Carlos Malta escolheu esses três temas – e mais um, “Se eu quiser falar com Deus”, do compositor da geração de Elis que talvez tenha melhor feito também essa transição, Gilberto Gil – para estas “Pimentinha Sessions”, na verdade quatro temas que continuam agora em 2024 o álbum “Pimenta – Tributo a Elis Regina”, lançado em 2000 e que no início do ano chegou às plataformas digitais. Se o repertório do álbum abordava o repertório digamos “clássico” de Elis e da MPB – de “Garota de Ipanema”, um Tom e Vinicius de 1962, a “O bêbado e a equilibrista”, um Bosco e Blanc de 1979 – sua continuação segue a trajetória de Elis, o curto, intenso e renovador período de 80 a 82, ano da morte precoce da cantora, aos 36 anos.

E se havia dúvidas quanto à intenção “renovadora” de Carlos Malta nas “Pimentinhas sessions”, no álbum original ele trabalhou com músicos de sua geração e agora, sem exceção, escolheu a dedo uma banda de músicos bem mais novos que ele: gente como o pianista Antonio Fischer-Band, de 26 anos, Giordano Gasperin no baixo, 33, o guitarrista Haroldo Eiras, 27, o cantor Matu Miranda, de 29, nos vocalizes, além de Antonio Sechin, de 27 anos, no saxofone e Fofo Black, 38 anos, na bateria, todos de gerações mais novas e estilos provocadores em seus instrumentos (como os compositores escolhidos por Elis).

O resultado faz jus à ousadia. “O trem azul”, também fazendo jus ao título, é uma viagem de 11 minutos em torno da música de Lô Borges, com o tema apresentado pela flauta de Malta, depois pelo piano de Antonio Fischer, e em seguida aberto a inesgotáveis improvisos guiados pelas incríveis variações rítmicas propostas pela cozinha de Gasperin e Fofo Black.

Trata-se, talvez, da versão mais compatível com o espírito da composição de Lô – aberta, brasileira, meio psicodélica – e do Clube da Esquina em geral, e da intenção de Elis em gravá-la naquele momento. O auge dessa versão inovadora se dá quando por sobre a “cama” da flauta baixo de Malta em uníssono com o sax soprano de Antonio Sechin, Haroldo Eiras e Matu Miranda trançam guitarra elétrica e voz no improviso. Som novo total.

No quesito fazer jus, nada supera no entanto “Alô, alô, Marciano”, que talvez pela letra humorística de Rita Lee sempre é apresentada como uma canção ligeira. Aqui, nas “Pimentinhas sessions”, guiado pelo sax soprano de Carlos Malta o tema é apresentado quase como um bebop, o fraseado dos instrumentos de sopro sempre curtos, inventivos sobre uma variação rítmica sempre nervosa, sincopada, com espaço também para interessantes improvisos vocais de Matu Miranda. Depois dessa sessão, o tema de Roberto de Carvalho entra definitivamente para o panteão de standards brasileiros.

“Aprendendo a jogar” também faz jus à sua incrível estrutura harmônica e é a que mais se aproxima, pelo menos na apresentação do tema, com a forma que Elis a apresentou em 1980. E, apesar dos intensos improvisos de sax, guitarra, voz e assim por diante, o que chama atenção nessa faixa é o conjunto tocando junto, desdobrando-se sobre o tema principal alegre, extrovertido de Arantes, uma bela peça de jazz capaz de incendiar qualquer festival (sobretudo se em palco aberto, num fim de tarde, aquele clima de felicidade total encontrando-se com uma trilha compatível).

Mestre Gil, que pode ser visto como tal em meio ao repertório e à banda de garotos, tem sua canção-solilóquio clássica tratada como um blues, uma balada a ser saboreada nota a nota (e suas variações propostas pelos músicos). Malta apresenta o tema no clarinete baixo com respeito e sotaque jazzístico. E aí inicia-se a pura diversão para quem toca e ouve com atenção, as variações sobre a melodia de Gil dando nova dimensão à conversa com Deus proposta na letra original.

Afinal, redescobrir músicas feitas há tanto tempo no repertório de uma cantora que já se foi também há tempos, e apresentá-las assim tão novas e cheias de ideias, também é uma forma de se dialogar com a eternidade, não?

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