O livro Repórter Eros: a história do jornalismo erótico brasileiro apresenta de forma ampla as publicações do gênero e traz à tona o debate sobre os costumes
Entre a edição da primeira revista e os portais e sites do gênero, a imprensa voltada aos temas carnais ou, se for da preferência do leitor, temas libidinosos ou sensuais, tem um longo percurso no Brasil. Mais de um século e meio. Neste intervalo, tais publicações têm não apenas incitado a libido de homens e mulheres, mas gerado polêmicas e provocado debates e embates nos campos da moralidade, sexualidade e gênero. É o que aponta o jornalista e pesquisador Valmir Costa no livro Repórter Eros: a história do jornalismo erótico brasileiro, recentemente lançado pela Cepe Editora. O lançamento aconteceu no último dia 20, na Livraria do Espaço, em São Paulo.
Na obra, Valmir Costa oferece uma grande contribuição para a história da imprensa e dos costumes no Brasil, em um campo pouco estudado: as práticas sexuais e a abordagem da imprensa ao longo de mais de 200 anos. Desde a origem da imprensa, em 1808, com fundação da Gazeta do Rio de Janeiro, passando pela imprensa erótica com a revista Ba-Ta-Clan (1867), que, escrita em francês, encaixa-se na fase embrionária da imprensa estudada, ao O Badalo (1893), a primeira revista propriamente erótica por ser escrita em português. Isso até o seu declínio com a migração para os meios digitais.
Para mostrar a evolução do jornalismo erótico nacional, o autor divide o processo em dez fases. Em ordem cronológica, o autor traça uma narrativa repleta de ineditismos, ousadias, avanços e retrocessos. “Ao longo da história, o sexo é cercado de tabus e de censuras. Nem por isso deixa de construir um discurso atraente e tentador”, afirma Valmir Costa. A comprovação do poder deste discurso, bem como as medidas para coibi-lo ou mantê-lo dentro dos padrões dos “bons costumes” — em torno do debate entre erotismo e pornografia — estão nas 696 páginas do título. A publicação é enriquecida com mais de uma centena de fotos e ilustrações, principalmente capas e páginas de revistas e jornais.
A pesquisa de Valmir Costa demonstra como as revistas incitaram a libido tanto de leitores heterossexuais quanto de homossexuais. Com uma pesquisa impressionante, revela como as publicações refletiram debates socioculturais sobre moralidade, sexualidade e gênero, além de abordar questões de machismo, feminismo, racismo e homofobia. A obra vai além do jornalismo. É uma valiosa contribuição interdisciplinar. Destaca curiosidades, como o uso das expressões “fazer sexo” e “transar” e põe fim à intrigante pergunta: de onde vem o termo depreciativo “veado”? O autor adianta que essa história vai surpreender, pois há muitas especulações a respeito.
“No mercado editorial brasileiro, várias foram as publicações eróticas com recorte de gênero. Primeiramente para homens heterossexuais, numa relação de poder, e posteriormente para mulheres heterossexuais e homens e mulheres homossexuais”, descreve. No rol das revistas eróticas, há títulos famosos e desconhecidos. Entre eles, O Badalo, O Rio Nu, O Nabo, O Coió, O Ferrão, Está Bom, Deixa…, O Empata, O Nu, O Pega na Chaleira, A Maçã, A Banana, Escândalo, Nudismo e Beleza, Indiscreta, Pô!, Psiu!, Penthouse, G Magazine, Nova, Homem, Fiesta, Lui, Rose, Privé, Ele Ela, Close (que lançou Roberta Close), Playboy, Playgirl, Playmen, Pleiguei, Spartacus, Alone, Sexy, Bananaloca, G Magazine, Sex Symbol, Hustler, Íntima, Sodoma, Lolitos, Ninfetos e Entre Ellas. Esta listagem serve como amostra da profusão do jornalismo libidinoso, uma mininarrativa irreverente das publicações.
Corpos femininos — A nudez ocupa espaço na imprensa erótica paulatinamente. E os corpos femininos são os primeiros expostos. Em 1906, a revista O Rio Nu inova e traz na capa a fotografia com três mulheres nuas. Era uma imagem artística. Daí até a liberação para se publicar o nu frontal se passam mais de sete décadas, indica o pesquisador. O primeiro nu frontal é publicado na edição de março de 1980 da Ele Ela. A mudança estimula o crescimento das tiragens nos anos seguintes. Em março de 1999, a Playboy com a modelo Suzana Alves, a Tiazinha, vendeu 1.223.000 exemplares. Em dezembro, as vendas da edição em que o destaque é a modelo Joana Prado, A Feiticeira, alcançam 1.247.000 exemplares.
Repórter Eros vai além de um estudo sobre o jornalismo erótico. Ao tratar das publicações, Valmir Costa contextualiza com os acontecimentos e ideias vigentes de cada época. Assim, o Brasil das revistas libidinosas, que começam se reportando aos cabarés, vem a ser ainda o país que vive sobre a forte influência da Igreja Católica, a censura imposta pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, o golpe civil-militar de 1964 e o sucesso das dançarinas da Discoteca do Chacrinha na televisão. Todas estas abordagens aparecem carregadas de ineditismo do passado para o presente, trazendo para o leitor explicações que o tabu em torno do tema deixou esquecido.
SOBRE O AUTOR
Repórter Eros: a história do jornalismo erótico brasileiro é o primeiro livro de Valmir Costa. Pernambucano, o autor graduou-se em Jornalismo pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e fez mestrado e doutorado em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). A experiência profissional do autor conta com passagens pelas universidades Mackenzie, Anhembi Morumbi e Uninove, lecionando Semiótica, Teorias da Comunicação, Redação e História do Jornalismo.